Não pego o trem sem empunhar um livro debaixo do braço. Pois nesse domingo estava voltando da casa materna, lendo durante a viagem o livro
Amestrando Orgasmos, de Ruy Castro (taradinho desde a infância, como se define). De repente uma mulher com uma bolsa rosa (logo me lembrou a Pink, do BBB5) me pergunta:
- Como se chama mesmo o livro que você está lendo? Amestrando Orgasmos? – em alto e bom som...
Não tive como negar, empunhando a publicação diante dos inquisidores olhares do vagão. Ela me pediu para ver, exitei no primeiro momento. Vai que a louca sai correndo com o meu livro, pensei (tenho trauma, pois quando era criança e recém tinha ganhado o Meu bebê, uma criança louca quis levá-lo de minhas mãos, a minha resistência, acabou puxando os sapatinhos e levando para sempre o item de fábrica). Mas ela queria ver “ao menos uma palavra, um trechinho”, então deixei que ela pegasse a obra na mão.
Tentei lhe explicar que o livro tratava sobre observações do autor sobre pesquisas científicas que haviam saído em jornais e que nem tudo estava relacionado ao sexo (afinal eu estava constrangida, depois de um olhar fuzilador que um casal do banco da frente me lançou). Ao que a mulher comenta mais alto ainda:
- E olha o que fizeram na capa, uma vagina e um chicotinho!!!!
Bah, já não tinha mais jeito...
- E o que tem dentro? Uma bunda????
Abri o livro e lhe mostrei outra “vagina”... Me perguntou uma vez mais ainda quem era o autor. Ainda lhe expliquei que se tratava do biógrafo do Nelson Rodrigues, para piorar a situação. Mas acho que ninguém entendeu...
A mulher se afastou, não sei se desembarcou ou o quê. Não tive coragem de sequer olhar para o lado. Só me restou enfiar novamente a cara no livro. Porém desta vez, fiquei constrangida com os risinhos sacanas e de canto de boca que estava dando enquanto lia o livro. Agora eu era observada... meu prazer orgástico na leitura havia sido descoberto. Mas não consegui me conter... Quem não iria largar um sorrisinho ao ler tal coisa sobre a amnésia coital (nome dado a uma pesquisa que os inglês fizeram donde constataram que durante o ato se esquece até o próprio nome):
“Segundo as estatísticas dos cientistas, metade desses casos de amnésia suspeita acontece com pessoas na faixa dos 44 anos – a idade do lobo, nos dois sexos. Isso significa que, se você tem por volta de 20 ou 30 anos e vive se gabando de ter uma memória perfeita e que é capaz de decorar até catálogo telefônico, é porque não deve estar transando direito. Mas, por que estou dizendo isto? Esqueci”.
Tentei recobrar a seriedade. Mas a próxima crônica era sobre “seios emborrachados” ao que ele revela, embora alguns médicos neguem, é que alguns seios de silicone apitam. Veja o trecho:
“Naquele momento, os únicos ruídos permitidos são as respirações mornas ou ofegantes e aquelas palavras definitivas de um para o outro, da boca para o ouvido, como “Gostosa!” ou “Tesão!”. Pois bem: no melhor da festa, ouvem-se silvos ou assovios, vindos do fundo do peito de um deles – como se um dos parceiros fosse asmático ou estivesse vaiando o outro. Mas não. É apenas um dos seios silvando: “Fzzzzzz. Fzzzzzz”.”
Daí não me agüentei. Levei a mão a boca para esconder os movimentos involuntários provocados pelo riso e a gargalhada interna que ecoava na minha mente.
Parei de ler o livro. Faltava umas duas estações, não gosto de interromper a leitura no meio do texto. Então comecei a me lembrar da cena da mulher descrevendo a capa da publicação. Horas antes mostrei a minha irmã e ao meu cunhado, mas nunca tive coragem de verbalizar: “uma vagina!!!” Nem mentalmente. Ao que a estranha fez em alto e bom som dentro do vagão lotado do trem! E comecei a pensar numa cena insólita onde estavam relacionados vagina, chicotinho e o título do livro. Não, definitivamente o chicotinho em ação não amestraria um orgasmo, como se faz com um animal. Pelo contrário, atiçaria a dita cuja. Confesso que nunca experimentei, mas acho que não se proporia a isso. E ficou comprovado: a capa do livro não quer fazer essa relação, ela quer sim é provocar mais, nada de amestrar, e foi exatamente isso que fez a mulher se manifestar em público.