Trajetória
Ainda faltam seis meses para que eu me forme e me torne legitimamente jornalista por formação acadêmica e eu consegui uma colocação como diagramadora, a área que eu pretendo trabalhar desde o segundo ano de faculdade e que foi objeto de estudo do meu trabalho de conclusão - já feito e aprovado desde o ano passado.
Estou com o coração partido por deixar o jornalismo online, que aprendi a gostar trabalhando, já que na faculdade ele é pouco e mal explorado, e continuo acreditando que ele um dia ainda vai acabar com as rotativas. E também pelas pessoas com quem trabalho. Mas estarei do ladinho, no outro prédio, e ainda na mesma empresa.
Com a euforia de ter chegado lá, um filme se passou na minha cabeça:
Eu me lembro do dia que saí do cursinho com o resultado de que havia passado no vestibular e com o currículo do curso. Vim olhando no trem e de tão fascinada das cadeiras que ia cursar, acabei perdendo a estação que tinha que descer. Naquela época eu nem sabia que existia diagramação. Mas passado o primeiro ano na Universidade, consegui estágio num jornal de Esteio e fui trabalhar na sucursal de Sapucaia do Sul. Seis meses ralando para fazer reportagens, tendo que ir aos lugares de ônibus e cobrir e tirar fotos ao mesmo tempo com uma antiga Pentax toda baleada e fui promovida a editora do jornal, mas continuava estagiária! Jornal pequeno é assim mesmo. Eu tinha 19 anos e mergulhei em todos os Manuais de Redação que conhecia e até o que não conhecia e descobri na época. Revisando e editando o jornal, acabei me aproximando da diagramação e quando vi já estava acumulando mais esta função, além de tratar as fotos também. O jornal também tinha gráfica e acabei aprendendo algumas coisas de impressão. O período neste jornal foi tão traumatizante na área de reportagem, que ali decidi que queria ser jornalista de redação. Aquela que não levanta a bunda da cadeira a não ser para tomar um café.
Passado exatamente um ano trabalhando 9h por dia com um salário miserável (pelo acúmulo ganhei 50 pila a mais) vi que o Correio do Povo precisava de gente no setor de Fotocomposição. E lá fui eu. Dei endereço do meu namorado na época, pentelhei, enchi o saco, ligava toda semana para saber se havia uma resposta ao teste e a entrevista que eu fiz, até que fui contratada. O teste era diagramar a coluna social do Eduardo Conil, no Quark, programa que eu conhecia pouco, pois usávamos o PageMaker no jornal que eu trabalhava. Lá aprendi de tudo! Transmitir arquivos via satélite para os Parques Gráficos, casar páginas, scanear anúncio em fotolitos e tratar os digitais, tirar fotolito, montar fotolito, gravar chapa e mandar o jornal para a rotativa, além de tratamento de fotos, onde acabei me especializando e ficando fixo nisso. Não estava mais diagramando, mas "rodeando" a área e trabalhando numa redação "de verdade".
Nesta época cursei uma das duas cadeiras de editoração eletrônica. Só que o professor logo viu que tudo que ele ia ensinar de diagramação eu já sabia, então me tornei monitora, não paguei a cadeira, auxiliava ele nas aulas e só fazia as provas para constar nas notas. Em seguida, caiu a disciplina de Projeto Gráfico e fiz uma única cadeira da área que eu mais gostava.
Mas voltando ao trabalho no Correio do Povo: não era fácil. Além de uma chefe que fazia coisas inacreditáveis que a gente acha que só existe em novela, eu morava em Sapucaia do Sul e saía do jornal a meia-noite. Nosso setor tinha um motorista exclusivo, mas a tal chefe não deixava ninguém ser levado em casa. Já ela ia fazer compras com o carro (ela é casada com um dos diretores, o Correio do Povo só perde no nepotismo para os políticos e olhe lá). Resumindo: eu saí da Caldas Jr. e ia até o Viaduto da Conceição a pé e sozinha todos os dias, depois da meia-noite. Louca! Hoje não sei como eu tinha coragem! Mas devo admitir que nunca fui assaltada neste trecho, fui ser em Sapucaia, já no portão de casa.
Na época em função disso, eu cogitei morar sozinha na Capital. Comecei a procurar apartamento, mas na última hora bateu uma menininha lá dentro de mim, chorei e não tive coragem de deixar o lar materno. Não estava preparada ainda... Bom lá fiquei até às vésperas de completar 22 anos. Fui demitida com uma leva de 150 pessoas e por ser a mais nova do setor (para gasterem menos com indenização, e a minha chefe não podia demitir um colega, por exemplo, que ia até a Renner pagar as contas dela). Mas aprendi muito lá. Posso dizer que de fome eu não morro, pois posso elaborar desde a pauta de um jornal até gravar a chapa para a rotativa.
Me dei ao luxo de ficar de férias até passar o Carnaval, então fui procurar emprego. A primeira entrevista que eu fiz foi para um estágio de Assessoria de Comunicação da Fundação Liberato. Fui contratada. Parece mentira, mas ir de Sapucaia a Novo Hamburgo é mais difícil que até Porto Alegre. Lá, além das tarefas de assessoria, fiz o projeto gráfico e diagramava o jornal da escola. Lá estava eu de novo, às voltas com a diagramação. Era estilo jornal mural, uma página, só frente, que era anexada na porta de cada sala de aula. Eu gostava do clima de lá. Eu tinha feito magistério. Me decepcionei com as crianças e comecei o Jornalismo enquanto estagiava para ganhar o título de professora. Mas eu tinha trabalhado na escola onde fiz o Ensino Médio e inclusive alguns mesmos professores trabalhavam lá. Só que o Liberato é uma fundação, não haveria nenhuma perspectiva de ser efetivada.
Cinco meses e apareceu uma vaga para jornalismo online de uma grande empresa do Rio Grande do Sul. O trabalho? Publicar os jornais desta empresa na internet, através de suas páginas diagramadas. Na primeira etapa da seleção, uma entrevista coletiva, perguntaram quem conhecia o software QuarkXPress. Só eu levantei a mão. Mas isso não foi suficiente para que eu fosse contratada. Ainda fiz uma prova de português, uma dinâmica de grupo e haveria ainda mais uma etapa se eu não os tivesse convencido de que deveriam me chamar. Mas também, as pessoas fazem cada coisa nestas dinâmicas. A semiótica, que é outra área que gosto muito, me ajudou. Mas daí não tinha jeito. O trabalho era de madrugada, eu não queria perder a vaga e disse que se contratada fosse, eu viria morar em Porto Alegre. E assim se fez. Num período que eu estava em lua-de-mel com a minha família.
Eu sabia que o trabalho noturno ia prejudicar a faculdade em algum momento, pois as cadeiras em sua maioria são oferecidas a noite. Mas não desisti. E o que parecia que não ia acontecer, se realizou. Surgiu uma vaga para o dia. Mas outra colega mais antiga também a queria. Ela ficou com a vaga, mas abriram uma para mim em outra área, onde já trabalharia com jornalistas, fazendo o mesmo trabalho, sem distinção. Exceto que no papel eu ainda seria assistente. Aí abandonei de vez a diagramação, pela primeira vez, estava me afastando das cercas que eu rondava, exceto pela monografia de Conclusão de Curso que eu estava fazendo , mas ela já estava praticamente pronta.
Aprendi muito. Peguei gosto pelo jornalismo online, principalmente porque o trabalho era basicamente edição de títulos, chamadas e porque eu era uma quase jornalista de redação, que só levanta da cadeira para fazer a ginástica laboral. Meu trabalho sempre bem valorizado. Sentia que confiavam nele e sempre tive um bom retorno sobre ele. Mas daí o sonho chamou mais alto e lá vou eu encarar um novo desafio.
Me preocupa com que precocidade as coisas acontecem comigo. Me preocupa o fato de jamais ter passado mais de dois anos no mesmo lugar. Acho que agora eu sossego o faixo, pelo menos por mais que dois anos. Mas o destino me levou por esse caminho e finalmente vou parar de rondar para finalmente trabalhar naquilo que gosto. A diagramação para mim é como ser correspondente internacional para muitos colegas. E vou poder cumprir as justificativas do ante-projeto do meu trabalho de conclusão:
"Pretendo com esta pesquisa, me aprofundar mais no assunto, para que isto seja útil na minha vida profissional, pois pretendo trabalhar nesta área. Acredito que um trabalho desta natureza me torne uma profissional com algo a mais, pois a diagramação não é necessariamente feita por jornalistas. É uma profissão regulamentada como de ensino médio, sendo realizada por técnicos. Mas a minha preocupação vai além da técnica, fazendo um aprofundamento em sua relevância no jornalismo. Acredito também, que através das entrevistas e observações que pretendo fazer com diagramadores, me insira dentro do contexto do mercado, fazendo com que crie contatos com estes profissionais." (não sei se ainda vale, mas onde vou trabalhar só contratam jornalistas ou formandos, que é o meu caso).
E fica aqui, com este meu relato, a prova da teoria que postei algum tempo atrás. Embora tudo foi construído lentamente, eu não tive pressa. Eu não me joguei obstinada a esse sonho. Eu valorizei o trabalho que eu fazia e procurava alternativas para melhorar dentro dele. É preciso acreditar no que se faz, independente do que se faz, e acima de tudo, como já disse, estar preparada para quando acontecer! Embora um pouco inexperiente na área, a minha paixão pela diagramação contagiou o jornalista que está me contratando, pois ele viu que eu acredito nisso e esse foi o grande diferencial. E eu que rondei tanto, finalmente vou selar o "casamento", como bem disse meu novo chefe.
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