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Esquizofrenias & Esquisitices

sexta-feira, julho 15, 2005

Localidad


Sempre gostei de ter lugares. Um lugar só meu, onde eu possa me perder e ser achada. Um refúgio, um canto para me esconder do mundo, seja em momentos de alegria, seja de tristeza.

Em casa, com meus pais, não tinha muito como ter isto. Só a casinha embaixo da árvore quando pequena e um refúgio para fazer orações. Quando morei no Centro, este lugar era o Quarto do Poeta, na Casa de Cultura Mario Quintana, que reproduzia o canto onde nosso escritor produzia suas obras e onde viveu, solitário, até morrer.

Meu desejo sempre foi estar, na verdade, perto do rio (que dizem que é bacia, lagoa, sei lá) Guaíba. Mas no Gazômetro, onde habitava próximo, nunca teve clima, com aquele comércio oportunista, além das pessoas que não brincavam de casinha debaixo de árvores, como eu fazia quando criança, mas ali moravam.

Agora, perto de onde estou vivendo encontrei o lugar perfeito e hoje fui lá tomar posse e batizar o MEU lugar. Trata-se de uma lage que invade as águas e te faz sentir inundada pela imensidão de H2O banhada pelo ouro do sol. Não chega a ser um píer, mas é como se fosse. Sem contar, que de um lado se tem as águas e do outro a margem, onde sente ouve o chegar do rio constantemente, sem nunca cansar. Além do mais, o caminho até lá não é de asfalto como perto da Usina, no lugar da pedra, a grama. É um lugar bonito, apesar dos som dos carros ao fundo.

Me deixei ficar por horas ali, pensando na vida e não pensando em nada. Tentando decifrar do que eram as embalagens que de vez em quando boiavam por ali. Fiquei olhando o sol que estava bem na minha frente e quando virei para ir embora senti seu calor nas minhas costas. Soltei minhas pernas para as águas e fiquei balançando, como criança em cima do muro. Senti as pequenas ondas baterem na pedra quando estavam mais fortes e senti pela primeira vez que estou no meu lugar.

Estes dias lendo o relato da Gi, fiquei pensando que ela encontrou seu lugar pela maneira como consegue apreciar as paisagens e aproveitar os lugares que tem conhecido estando no coração da natureza. Senti um pouco disso hoje. Claro, que ficava sempre em alerta para que nenhum estranho se aproximasse, tinha o barulho urbano do outro lado, mas a corrente de ar que senti era diferente perto das águas, e também gosto da parte urbana, por isso acho que estou no lugar certo. E alguns acontecimentos dos últimos dias me dizem que vou conseguir chegar onde eu quero estando aqui mesmo, em Porto Alegre. Pelo menos até o máximo de planos que fiz. Depois disso, aí não sei mais, ainda não planejei o que vou fazer quando alcançar tudo que já sonhei até agora.

Enquanto estava lá, também pensei que se eu estivesse num romance, seja de livro ou de filme, aquele seria o lugar onde me encontrariam, ou talvez onde nos encontraríamos. Apesar de ser bonito, por enquanto este é um canto só meu e para ser compartilhado, precisará da aprovação do meu coração, que por ora não está preocupado com isso. Eu nem sinto batê-lo. Sei que bate porque ainda estou viva. Mas tirando este fato, ele não ocupa mais meus pensamentos. Estou leve, livre, do jeito que me senti quando abri os braços diante da imensidão do rio e do calor do sol, este companheiro que parecia me seguir quando fui embora. Se bem que, às vezes, sinto que é mais triste estar assim do que estar com o coração ocupado, mesmo quando por alguém que não vale a pena ou não corresponda. A verdade é que nunca estamos satisfeitos.

De agora em diante vou juntar as pedras do caminho. Já tenho onde jogá-las, como fazia a Amèlie Poulain...